sábado, 23 de fevereiro de 2013

Meditação do Rosário III

Os mistérios luminosos
Cônego Henrique Soares da Costa

1. O batismo de Jesus
Leitura: Mt 3,13-17; Mc 1,9-11; Lc 3,21-22; Jo 1,24-34
Este primeiro mistério luminoso é riquíssimo de significado. Vamos contemplá-lo tomando cinco aspectos, quatro facetas desta riquíssima realidade:
1. O batismo do Senhor marca o início de seu ministério público. É verdade que o Senhor Jesus começou sua obra de salvação no momento mesmo de sua Encarnação no seio da Virgem Maria (cf. Hb 10,5-7); ele foi nos salvando nos nove meses de gestação de sua Mãe, na pobreza de seu nascimento, nos anos pobres e apertados de Nazaré, na vida pequena e silenciosa de cerca de trinta anos... Em tudo isso ele foi entrando na nossa vida, no nosso tempo e tudo redimindo, a tudo dando um sabor de eternidade. Mas, se Jesus somente tivesse vivido e morrido entre nós, sem pregar, sem anunciar explicitamente o Reino por palavras e gestos poderosos e cheios de autoridade, se não tivesse escolhido apóstolos e fundado sua Igreja, jamais saberíamos que Deus nos visitou, que fomos salvos e jamais poderíamos responder conscientemente com nossa fé a esse anúncio de salvação. Assim, batizado no Jordão, Jesus é publica e oficialmente apresentado como o Messias esperado por Israel. Nele, se cumpre as esperanças do Antigo Povo e Deus revela sua fidelidade: quando promete, não trai jamais!
2. É impressionante e deve nos inspirar a humildade do Senhor Jesus: ele, que na infância toda submeteu-se humildemente à Lei judaica, agora entra na fila dos pecadores para ser batizado por João. Não somente entra na fila como um qualquer, mas na fila dos que se reconhecem pecadores, necessitados de arrependimento e perdão. Jesus, que não tem pecado, veio assumir nossos pecados para nos libertar dos pecados. Ele é o cordeiro que veio tirar os pecados do mundo. A imagem do cordeiro deve nos recordar o cordeiro sobre o qual o sacerdote impunha as mãos, confessando os pecados do povo. Depois ele era mandado para o deserto. Assim também Jesus: carregando os nossos pecados foi crucificado fora dos muros de Jerusalém, como um rejeitado por Deus e pelo seu povo (cf. Lv 16,5-22; Hb 13,12s); o cordeiro é ainda imagem do cordeiro sacrificado e oferecido a Deus pelos pecados do povo (cf. Lv 16,5-22) e, finalmente, é imagem do cordeiro pascal, sinal da libertação do povo de Deus. Dele, nenhum osso deveria ser quebrado (cf. Ex 12,46; Jo 19,33-36). Pois bem, na fila dos pecadores Jesus se nos apresenta como esse humilde e despojado cordeiro de Deus.
3. O batismo é também o momento da unção messiânica do Senhor. Ele é o Ungido, isto é, o Messias. Já ungido em sua humanidade santíssima, plasmada desde o primeiro momento na potência do Espírito Santo (cf. Lc 1,35), recebe agora uma unção pública (que será unção plena na ressurreição – cf. At 2,32.36) com vistas ao seu ministério público. A partir de agora, Jesus será pleno do Espírito Santo, que o conduzirá na sua missão (cf. Jo 1,33-34; Mc, 1,12; Lc 4,14.17-18; 6,19). Será este mesmo Espírito que o Senhor entregará na cruz ao Pai e receberá de volta de um modo novo na Ressurreição, derramando-o sobre nós (cf. Jo 19,30; At 2,32s).
4. É também para nossa contemplação a palavra de João Batista ao apresentar Jesus: “Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo!” (Jo 1,19). A palavra aramaica é talya que significa ao mesmo tempo cordeiro e servo. Jesus será o Messias Servo Sofredor, cordeiro que morrerá pelos pecados do mundo (cf. Is 42,1-9; 49,1-6; 50,4-11; 52,13 – 53,12).
5. Finalmente, há neste mistério, uma clara manifestação da Trindade Santa: o Pai apresenta o Filho, ungido-o com o Espírito; o Filho humildemente se deixa ungir, como enviado do Pai e seu Servo Sofredor; o Espírito Santo, deixa-se enviar pelo Pai sobre o Filho, em quem repousa e permanece para a missão. Ao aparecer em forma de pomba (como a pomba que, após o dilúvio, trouxe no bico um ramo de oliveira, da qual se faz o óleo da unção), o Espírito manifesta Jesus como aquele que, ungido, é o início de uma nova criação e nova humanidade, como o mundo logo após o dilúvio.
2. A transformação da água em vinho em Caná da Galiléia
Leitura: Jo 2,1-12
Vamos contemplar este mistério a partir de cinco idéias.
1. As bodas de Caná, na narrativa de São João, são imagem da consumação da aliança entre Deus e o seu povo, consumação acontecida precisamente em Jesus, o Messias de Deus. Muitíssimas vezes no Antigo Testamento, a aliança entre Deus e Israel fora comparada a um pacto matrimonial: Deus é o esposo fiel, Israel é a esposa, tantas vezes infiel, prostituindo-se na idolatria. Assim, diante do fracasso da antiga aliança, Deus promete que fará uma aliança eterna com um resto. Seria uma aliança espiritual, nova e eterna. O Messias, com a sua vinda, haveria de selar tal aliança. Pois bem, Caná é imagem dessa nova realidade. Chegaram as núpcias da nova aliança. Jesus é o esposo, o próprio Deus que vem desposar o novo Israel, a Igreja, sua esposa. Aí, a Igreja, a Mulher, é representada pela Virgem Maria. Daí Jesus chamá-la “Mulher”! Assim, contempla-se aqui a fidelidade amorosa do Deus de Israel, que cumpre sua promessa de uma aliança nova e eterna e vem desposar Israel, sua esposa.
2. Estas núpcias, prenunciadas em Caná, somente na Páscoa (morte e ressurreição) do Senhor é que iriam consumar-se. O evangelho insinua isso quando afirma: “No terceiro dia houve núpcias... e Jesus manifestou a sua glória... e seus discípulos creram nele” (Jo 2,1.11b). Isto que aqui é prenunciado, na ressurreição será realizado: ao Terceiro Dia, dar-se-ão as núpcias do Cordeiro (cf. Ap 19,7), quando o Ressuscitado mostrou a sua glória e seus discípulos creram nele! Então, pode-se contemplar neste mistério a união fiel e amorosa entre Cristo e a sua Igreja numa nova e eterna aliança de amor, que começou neste mundo com a morte e ressurreição do Esposo e será plena, um Dia, na glória dos céus. Até lá, a Esposa, ansiosa e amorosamente, caminha exclamando ao Esposo: “Vem!” e ele, fielmente responde: “Sim, venho em breve!” (Ap 22,17.20).
3. Ainda digno de contemplação é a água que enchia as talhas usadas para a purificação ritual segundo a Lei dos judeus transformada no vinho novo e bom, sinal do dom do Espírito, Nova Lei da nova e eterna aliança. É o que Jesus, o Ungido do Pai veio nos trazer: a nova aliança no Espírito Santo, Espírito que embriaga e nos dá a perene alegria de Deus (cf. Ef 5,18).
4. Outro ponto para a meditação é o papel exercido pela Mãe do Senhor: “A Mãe de Jesus estava lá” – em Caná e ao pé da cruz (cf. Jo 19,25); estará também com o fruto da Páscoa, da Hora de Jesus: a Igreja nascente, no Cenáculo de Jerusalém (cf. At 1,12-14). É importante compreender isso: a Virgem Mãe nunca é o centro. Centro da nossa fé, centro da nossa salvação é somente o Senhor Nosso Jesus Cristo. Centro de nossa fé é a sua Páscoa: paixão, morte e ressurreição. E, no entanto, em ser o centro, a Virgem sempre está no centro, isto é, sempre está ali, no momento pascal do Senhor, no momento-chave da nossa salvação! Assim contemplemo-la como ministra (servidora) na obra salvífica de Cristo! Ela é não somente nossa Mãe na ordem da graça como também é modelo de serviço e cooperação na obra salvífica de Cristo.
5. Um último ponto para nossa contemplação é o papel de intercessão de Nossa Senhora. Em Caná ela vê a necessidade dos noivos e intercede; sua intercessão é toda obediente, toda de escuta à palavra de Jesus e de plena conformidade com sua vontade. Assim, ela mesma nos ensina a fazer sempre a vontade do Senhor: “Fazei tudo o que ele vos disser!” E, num dos momentos mais impressionantes do Novo Testamento, que deixa confusos até os estudiosos mais eruditos, a Hora do Senhor, Hora de manifestar sua glória na paixão e ressurreição, é misteriosamente antecipada: “A minha Hora ainda não chegou!” Quem pode mudar a Hora de Deus? Ninguém! E, no entanto, misteriosamente, sem pedir nada, sem exigir nada (ela é a Serva e uma serva não tem direitos, não exige nada!), ela antecipa a Hora! Pela sua atitude de amor, de confiança, de humildade, misteriosamente a Hora do Cristo faz-se misteriosamente em Caná e traz o vinho do Espírito, o bom vinho da alegria, sinal do Reino de Deus. Mas, isso somente é possível porque quando chegar a Hora (cf. Jo 17,1), a Mãe de Jesus estará lá, ao pé da cruz (cf. Jo 19,25). Então, somente é possível a intercessão em Cristo quando se estar disposto a levar a cruz com Cristo, permanecendo com ele na sua Hora, na Hora da cruz. Fora disso nenhuma intercessão é possível, nenhuma é válida, nenhuma é em Cristo! Não poderá nunca participar da manifestação da glória de Cristo não está disposto a participar da hora da paixão do Cristo!
3. O anúncio do Reino de Deus e o convite à conversão por parte de Jesus
Leitura: Mc 1,14-15
Podemos dividir a contemplação deste mistério em quatro partes:
1. Jesus saiu proclamando o Evangelho de Deus, isto é do Pai. Pensemos em Jesus. Ele veio da parte do Pai. No nosso Salvador, podemos descobrir toda a bondade da paternidade do nosso Deus. Em Jesus, Deus nos diz que ainda nos ama, que ainda nos espera, ainda crê em nós; mais ainda: dá-nos o seu Filho bendito, que vem ao nosso encontro com os braços e o coração abertos. Em Jesus, aconteça o que acontecer na nossa vida, sabemos que Deus nos ama, faz conta de nós e deseja nos salvar! No rosto de Cristo contemplemos, portanto, a Face bendita do Pai: que sua Face resplandeça sobre nós!
2. Qual é a proclamação de Jesus? O que ele prega? Primeiro: “Cumpriu-se o tempo!” Com Jesus, tudo quanto o Antigo Testamento havia anunciado iria agora realizar-se. Termina agora o tempo da preparação, termina o tempo da profecia, termina o tempo do anúncio distante: com Jesus as promessas de Deus iriam realizar-se. Eis a grande lição: Deus é fiel, nunca falta à sua promessa, nunca volta atrás na sua Palavra! Tudo quando fora anunciado e prometido agora haverá de cumprir-se. Jesus é o Amém, o Sim de Deu a todas as suas promessas!
3. Mas, em que consiste esse cumprimento? “O Reino de Deus está próximo!” Isto é, o Reinado de Deus chegou, aproximou-se, não mais está distante! Com Jesus, Deus está batendo à porta do coração de Israel e da humanidade, pedindo passagem, desejando entrar! Com Jesus, Deus começa o seu Reinado. E onde Deus reina, o homem é feliz, é livre, começa a viver uma vida plena, que desembocará na eternidade. É isto que Jesus manifesta com seus milagres, exorcismos e palavras: que o Reino chegou e, por isso, os cegos enxergam, os coxos andam, os que choram são consolados e os pobres recebem essa Boa-Nova! Também nós devemos escutar esta Boa-Notícia, este Evangelho: o Reino de Deus chegou para nós! Basta que acolhamos Jesus, presente para nós na Santa Igreja, basta que deixemos que o Senhor reine em nossa vida! Deus está às portas; não lhe fechemos o coração!
4. Mas, para que o anúncio do Reino seja eficaz em nossa vida, é necessário a aceitação de nossa parte. Daí a exortação do Senhor: “Convertei-vos e crede no Evangelho!” Isto é: Convertei-vos e crede neste Evangelho! Que Evangelho? Que o Reino chegou em Jesus. E ninguém pode acolhê-lo, ninguém pode realmente deixar Deus reinar sem se esvaziar de si próprio, do seu pecado, dos seus apegos, dos seus vícios, de suas más tendências! Converte-vos! Eis a condição para acolher o Reino. Então, se ao mesmo tempo o anúncio do Reino é uma alegria imensa é também um imenso desafio, um imenso trabalho de conversão constante! A verdade é que sem conversão não se acolhe verdadeiramente o Reino de Deus!
4. A Transfiguração do Senhor
Leitura: Mt 17,1-9; Mc 9,2-8; Lc 9,28-36; 2Pd 1,16-18
A Transfiguração do Senhor não é somente um fato histórico ocorrido durante a vida de Jesus neste mundo; é também um mistério, isto é, um acontecimento que tem um significado para a nossa fé, um acontecimento que revela algo da pessoa e da missão de Cristo e algo da nossa salvação. É isto que contemplaremos agora.
Primeiramente, a Transfiguração é uma preparação para a cruz. “Seis dias depois” (Mt 17,1) de anunciar pela primeira vez que morreria em Jerusalém, o Senhor toma três de seus discípulos e se transfigura diante deles. Ou seja, deseja fortalecer a fé de seus discípulos e mostrar que sua paixão caminha para a glória. Não é por acaso que os mesmos que estarão no Jardim do Horto, na agonia, foram os escolhidos para vê-lo em glória no Tabor. Esta idéia aparece ainda muito claro no fato de Moisés e Elias aparecerem com ele falando “de sua partida que iria se consumar em Jerusalém” (Lc 9,31). O sentido é muito bonito: Moisés (que representa a Lei) e Elias (significando os profetas) – Lei e profetas são o Antigo Testamento – anunciam a “partida”, o “êxodo” de Cristo: “Os profetas anunciaram! Não era preciso que o Cristo sofresse tudo isso e entrasse na sua glória? E começando por Moisés e por todos os profetas, interpretou-lhes em todas as Escrituras o que a ele dizia respeito” (Lc 24,25-26). Tudo isto nos ensina a guardar nos momentos de luz o sentido do amor e da misericórdia de Deus, para resistir nas provações dos momentos de sofrimento e de treva!
Um outro belo aspecto: no Tabor manifesta-se a glória da Trindade: na voz está o Pai, naquele que foi transfigurado está o Filho bendito, na Nuvem luminosa está o Espírito Santo, que é o Espírito de Glória e que a tudo glorifica. Toda a nossa salvação é obra da Trindade. Basta recordar que o Pai enviou o Filho no Espírito Santo para nossa salvação e que o Filho se ofereceu por nós ao Pai num Espírito Eterno (cf. Hb 9,14). Eis aqui outro belo ponto para a contemplação: adorar o amor glorioso e cheio de misericórdia do Deus Uno e Trino, que se nos revela sempre como amor para nossa salvação.
Também devemos aprender a contemplar o que o Pai nos diz: “Este é o meu Filho amado; ouvi-o”. Ou seja: toda a nossa felicidade, toda nossa vida e nosso único caminho para a verdadeira glória consiste em ouvir a voz do Filho amado. Esse “ouvir” não significa simplesmente estar atento à palavra de Jesus, mas, estar atento à própria Pessoa de Jesus: ele todo é a Palavra que estava junto do Pai e que se fez carne e habitou entre nós. Assim, amar Jesus, buscar Jesus, seguir Jesus, contemplar Jesus... tudo isto significa “ouvir” a voz do Filho, que é a única, plena e irrepetível Palavra que o Pai nos dirige no Espírito Santo!
Um outro aspecto que diz muito de nós e deve nos levar a um exame de consciência é o seguinte: no Tabor, os três discípulos se alegram e dizem: “É bom estarmos aqui; vamos fazer três tendas”. É agradável e desejável estar com Cristo na glória, no gozo, na alegria... Depois, no Monte das Oliveiras, esses mesmos três não tem coragem de vigiar com Jesus, dormem, não conseguem estar atentos ao Senhor e ficar com ele! Eis as lições para nós: Quem participa da glória do Tabor deve também estar disponível para ficar com Jesus no Horto da Agonia, pois quem não ama a cruz de Cristo não verá a glória de Cristo! Não se pode ser cristão de verdade sem essa disponibilidade para estar com Cristo nos momentos de cruz e escuridão! Nunca compreenderá de verdade o significado da glória de Cristo quem não participou também da agonia de Cristo. Sem participar da sua cruz, a participação na sua glória seria num sentido interesseiro e mundano, glória do mundo, que não passa de busca de si próprio, que escraviza e não leva a Deus. Somente participando da cruz do Senhor é que experimentaremos o verdadeiro significado e a verdadeira doçura da glória do Senhor. É por isso que Cristo proíbe aqueles três de falarem sobre isso até que ele tenha ressuscitado dos mortos. Somente depois que o virem morrer é que compreenderão o significado da glória da sua ressurreição e da esperança que ele nos prepara!
5. A instituição da Eucaristia
Leitura: Mt 26,26-29; Mc 14,22-25; Lc 22,19-20; Jo 6,51-58; 1Cor 11,23-25
Muitas coisas poderiam ser contempladas neste mistério. Vou tomar cinco pontos, que podem ser de grande utilidade e edificação espiritual para nossa vida.
1. Na instituição da Eucaristia Jesus realiza sacramentalmente a consumação de sua vida que, na Sexta-feira Santa, realizou na cruz. Toda a sua existência, desde a concepção no seio da Virgem, foi uma entrega ao Pai por nós. Ele nunca teve tempo para si mesmo, nunca se buscou, nunca se poupou, nunca procurou sua vontade. Ao final de sua existência, “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o extremo, até o fim” (Jo 13,1s). Então, toda a existência de Nosso Senhor foi uma existência para o Pai em favor dos outros, em favor dos seus discípulos e irmãos. Agora, na hora de consumar essa vida vivida como entrega total de si, o nosso Salvador, deixa sua entrega num modo sacramental, para que fique presente no coração da Igreja e do mundo até que ele venha. Na Eucaristia a entrega de Cristo, vivida uma vez por todas na sua humana existência, torna-se continuamente presente sobre o Altar para que nós a recebamos em verdade. Cada cristão de cada época e de cada lugar pode dizer, participando da Eucaristia e recebendo o Corpo e o Sangue do Senhor: “Ele me amou e se entregou por mim!” (Gl 2,20).
2. Contemplando o Cristo que se entrega totalmente no simples sinal do pão e do vinho, tornando presente sua entrega total até a morte de cruz, nós somos convidados a compreender a lógica do Reino de Deus: ele não vem em grandes e vistosos feitos, nos gestos teatrais, no poder mundano, derivado do prestígio, da riqueza, do comando... Não! A lógica do Reino aparece no que é pequeno, no que é fraco, naquilo que aparentemente não conta e não tem importância. Que pode haver de mais trivial que um pedaço de pão, um pouco de vinho, umas gotas d’água? E, no entanto, nestes pobres elementos o Senhor se dá a nós e faz-nos participar da sua entrega de amor e já participar das coisas do céu. Esta contemplação deve nos fazer descobrir o valor das coisas pequenas, da fidelidade no cotidiano. Ali Deus se revela, ali nós somos convidados a viver na nossa carne a Eucaristia que celebramos na santa Liturgia.
3. A Eucaristia é também a missão e o destino da Igreja. É sua missão por dois motivos: primeiro, porque o Senhor mandou que ela a celebre em sua memória até que ele venha. Celebrando-a, a Igreja cumpre o mandato do seu Esposo e experimenta realmente sua presença. Em segundo lugar, é sua missão porque tendo escutado o Senhor na Escritura e partido com ele o pão, a Igreja experimenta que ele está vivo realmente, que realmente caminha conosco. Assim, como aqueles dois de Emaús (cf. Lc 24), ela deve sair pelo mundo em missão para anunciar que em verdade o Senhor ressuscitou e caminha conosco como Salvador e Senhor até o fim dos tempos. Deste modo, participar da Eucaristia, ouvindo o Senhor e partindo com ele o pão eucarístico, tornamo-nos suas testemunhas. A Eucaristia nunca é uma realidade somente entre nós e o Senhor. Nós dela participamos como Igreja e Igreja que é missionária de Cristo na nossa vida e no nosso mundo.
4. Outro aspecto importante é ter sempre em mente que a Eucaristia prepara nossa participação no Banquete da glória eterna. Participar da Eucaristia é participar das coisas do céu, é experimentar aqui na terra a glória do mundo que há de vir! Assim, nunca devemos perder de vista que comungando com o Senhor morto e ressuscitado nos tornamos herdeiros da sua santa Ressurreição. Quanto consolo, nos apertos e cansaços da vida, nutrirmo-nos do alimento que faz crescer em nós a vida eterna, aquela mesma que herdaremos em plenitude após a nossa santa morte: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia”.
5. Um último aspecto. A Eucaristia é o sacrifício de Cristo. Cada vez que a celebramos, oferecemo-lo ao Pai, como Senhor, Cordeiro imolado e ressuscitado, Aquele que está de pé, vitorioso, ante o trono do Pai, mas, ao mesmo tempo, é eternamente Cordeiro imolado (cf. Ap 5,6). Assim sendo, celebrar a Eucaristia, participando do Corpo e Sangue do Cordeiro imolado, somos chamados a colocar na nossa vida o Sacrifício que celebramos, celebrando na vida o que oferecemos no Altar. É o que nos diz São Paulo: “Exorto-vos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais vossos corpos como hóstia viva, santa e agradável a Deus: este é o vosso culto no Espírito. E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando a vossa mente, a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, agradável e perfeito” (Rm 12,1-2). Então, não pode participar da Eucaristia quem não estiver disposto a completar na sua carne, a viver na sua vida a entrega do Senhor Jesus ao Pai!

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