Dogmas Marianos

MARIA, MÃE DE DEUS
 Maria é mãe de Jesus; Jesus é Deus; Logo, Maria é mãe de Deus. A partir do silogismo acima, tentaremos esclarecer a polêmica envolvendo o título "Mãe de Deus", com que os católicos se dirigem a Maria, mas que alguns protestantes negam veementemente. Tais protestantes aceitam como verdadeiras as proposições "Maria é mãe de Jesus" e " Jesus é Deus", mas negam a conclusão, ou seja, de que podemos chamar Maria de Mãe de Deus. Necessário, porém, compreender o que a Igreja quer dizer quando fala em Maria como mãe de Deus. Jesus Cristo, segunda pessoa da santíssima Trindade, existe desde toda a eternidade. Ele procede do Pai por uma geração espiritual, na qual não intervém evidentemente nenhuma criatura humana. Portanto, Maria não é mãe do Filho de Deus quanto à sua origem divina, mas é mãe do "verbo encarnado", do Filho de Deus feito homem. E porque não dizer simplesmente que Maria é mãe de Jesus ? Porque Jesus é uma só pessoa. Em Cristo, Deus e o homem formam um único ser. Não se trata do espírito de Deus "habitando" um corpo humano ou um líquido dentro de uma embalagem qualquer. Enfim, Cristo não pode ser dividido. Portanto, Maria é mãe do todo, e não de uma "parte". Mesmo se, no lugar de Cristo (único ser, com natureza divina e humana), considerássemos um simples ser humano, percebemos o que quer dizer a palavra maternidade. Assim, por exemplo, falamos que Agostinho é filho de Mônica. Não dizemos apenas que Mônica é 65 "mãe parcialmente" de Agostinho, já que este teria um pai terreno, para o "resto do seu corpo" (?!), e um pai celestial, para a alma. No caso de Jesus, isto se torna ainda mais evidente. Eis como o anjo responde a Maria, em Lc 1,34-35: "Maria perguntou ao anjo: "Como acontecerá isso, pois não conheço homem?" Em resposta o anjo lhe disse: "O Espírito Santo virá sobre ti e o poder do Altíssimo te cobrirá com sua sombra; é por isso que o menino santo que vai nascer será chamado Filho de Deus." É a própria Santíssima Trindade (O Espírito Santo; o Altíssimo/Javé; o Filho de Deus/Jesus) que envolve Maria no sublime mistério da Encarnação. Enfim, Maria, mãe de Jesus, o Filho de Deus, deve ser chamada Mãe de Deus, porque a maternidade se refere sempre à pessoa. A mãe de um homem não é só a mãe de seu corpo. Ela é mãe da pessoa toda. Assim também Maria é mãe de seu Filho, como pessoa divina e humana que Cristo é. Aliás, a questão é muito mais de cristologia do que de mariologia, pois envolve diretamente a unidade de Cristo (Deus e homem em uma só pessoa, indivisível). Cabe ainda lembrar que esta questão já foi tratada na era patrística, isto é, do Cristianismo primitivo. De fato, Nestório, bispo de Constantinopla, negava o título de "Theotokos" ("Mãe de Deus") a Maria. Só que Nestório sabia muito bem o que isto significava: a conseqüente negação da natureza de Cristo, homem e Deus. Os protestantes de hoje parecem ignorar esta realidade, ou então não perceberam o que significa distorcer o silogismo feito logo no início deste artigo. Seja como for, a mesma história patrística mostra a forte reação dos cristãos contra Nestório, que resultou no Concílio de Éfeso, no ano de 431, reconhecendo a legitimidade do título de Mãe de Deus, dado a Maria, e condenando as idéias nestorianas. Ou lembrando São Tomás de Aquino, para quem a negativa de uma verdade cristã implicava negar todo o conjunto do Cristianismo. Realmente, cada ponto do Cristianismo é tão intimamente ligado aos outros, que a exclusão de um pode fazer desmoronar todo o edifício. Não deixa de ser o retrato do protestantismo hoje, onde a negação de algumas verdades resultou em milhares de seitas, como um prédio destroçado. Um exemplo disso é o fato de muitos protestantes não seguirem nem mesmo os reformadores, como se vê abaixo: "Quem são todas as mulheres, servos, senhores, príncipes, reis, monarcas da Terra comparados com a Virgem Maria que, nascida de descendência real (descendente do rei Davi) é, além disso, Mãe de Deus, a mulher mais sublime da Terra? Ela é, na cristandade inteira, o mais nobre tesouro depois de Cristo, a quem nunca poderemos exaltar bastante (nunca poderemos exaltar o suficiente), a mais nobre imperatriz e rainha, exaltada e bendita acima de toda a nobreza, com sabedoria e santidade." (Martinho Lutero no comentário do Magnificat, cf. escritora evangélica M. Basilea Schlink, revista "Jesus vive e é o Senhor"). "Ser Mãe de Deus é uma prerrogativa tão alta, coisa tão imensa, que supera todo e qualquer intelecto. Daí lhe advém toda a honra e a alegria e isso faz com que ela seja uma única pessoa em todo o mundo, superior a quantas existiam e que não tem igual na excelência de ter com o Pai Celeste um filhinho comum. Nestas palavras, portanto, está contida toda a honra de Maria. Ninguém poderia pregar em seu louvor coisas mais magníficas, mesmo que possuísse tantas línguas quantas são na terra as flores e folhas nos campos, nos céus as estrelas e no mar os grãos de areia." (Martinho Lutero) "Não podemos reconhecer as bênçãos que nos trouxe Jesus, sem reconhecer ao mesmo tempo quão imensamente Deus honrou e enriqueceu Maria, ao escolhê-la para Mãe de Deus." (João Calvino, Comm. Sur l'Harm. Evang.,20) Que Maria, Mãe de Deus e da Igreja, proteja todos os seus filhos.

 MARIA, SEMPRE VIRGEM 
Desde o início do cristianismo Nossa Senhora é venerada como "Áiepartenon", isto é, "Sempre Virgem".A maioria cristãos acredita na virgindade de Nossa Senhora antes de parto e durante o parto. Os cristãos protestantes negam que ela tenha permanecido virgem durante sua vida terrena. Demonstraremos abaixo as 3 situações de sua virgindade.

Nossa Senhora era Virgem antes do Parto Este fato pode-se constatar na própria Bíblia: "O Anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma virgem desposada... e o nome da Virgem era Maria" (Lc 1,26). Nossa Senhora ainda dá testemunho de sua virgindade ao responder ao Anjo: "Como se fará isso, pois eu não conheço varão?"

 Nossa Senhora permaneceu Virgem durante o Parto O que é concebido por milagre deve nascer por milagre. O nascimento é uma conseqüência da concepção; sem o milagre do nascimento virginal, o milagre de se manter a virgindade de Nossa Senhora estaria incompleto. Deus então teria operado um milagre incompleto. E isto está conforme à profecia "uma virgem conceberá e dará à luz". E a própria Bíblia confirma a profecia: "Ora, tudo aconteceu para que se cumprisse o que foi dito pelo Senhor, por meio do profeta." (Mt 1,22); ou seja, conceber e dar à luz, virginalmente.

Nossa Senhora permaneceu Virgem durante sua vida terrena Segundo a tradição, Nossa Senhora havia feito um voto de castidade perpétua e assim o manteve, mesmo vivendo com S. José, como fica clara pela própria afirmação dela : "Eu não conheço varão", quando já estava desposada de S. José. São Marcos, na mesma linha, chama Jesus "O filho de Maria" - "uiós Marias" (Mc 6,3), e não um dos filhos de Maria, querendo mostrar que ele era o seu filho único. Os protestantes se utilizam da expressão "antes de coabitarem" para demonstrar que Nossa Senhora teve relações sexuais com São José. Vamos ao trecho em questão: "Maria, sua Mãe, estava desposada com José. Antes de coabitarem, ela concebeu por virtude do Espírito Santo" (Mt 1,18). Ora "antes de coabitarem" significa apenas "antes de morarem juntos na mesma casa". Isso aconteceu quando "José fez como o anjo do Senhor lhe havia mandado e recebeu em sua casa sua esposa." (Mt 1,24). Nossos irmãos separados cometem outro engano acerca da expressão "filho primogênito", para continuar negando a Virgindade 66 perpétua de Nossa Santa Mãe. Esta expressão é usada por São Lucas: "Maria deu à Luz o seu filho primogênito" (Lc 2,7). "Filho primogênito" significa somente "primeiro filho", podendo ele ser filho único ou não. A Lei de Moisés exige que todo primogênito seja consagrado a Deus, quer seja filho único ou não. É como observamos em: "Consagrar-me-ás todo o primogênito entre os israelitas, tanto homem como animal: ele é meu" (Ex. 13,2). Ainda no livro do Êxodo observamos: "Todo o primogênito na terra do Egito morrerá" (Ex. 11,5). E assim aconteceu: "Não havia casa em que não houvesse um morto" (Ex. 11,30). Como em todos os países, deveria haver casais de um só filho; como por exemplo, todos os que haviam se casado nos últimos anos. Em outro trecho da Bíblia, o Senhor ordena: "contar todos os primogênitos masculinos dos filhos de israel, da idade de um mês para cima" (Num 3,40). Se há primogênito de um mês de idade, como é que se pode exigir que, para haver primeiro, haja um segundo? O segundo texto bíblico preferido dos protestantes é este: "José não conheceu Maria [não teve relações com ela] até que ela desse à luz um filho." (Mt 1,25). Estaríamos certos em pensar que José "conheceu" Maria após ela "ter dado à luz um filho."; se o sentido bíblico da palavra "até" não fizesse referência apenas ao passado. Isto quer dize que é errado pensar que depois daquele "até", José deveria "conhecer" Maria. Observe os exemplos: "Micol, filha de Saul, não teve filhos até ao dia de sua morte" (II Sam 6,23). Será que após a sua morte Micol gerou filhos? Falando Deus a Jacó do alto da escada que este vira em sonhos, disse-lhe: "Não te abandonarei, enquanto[até] não se cumprir tudo o que disse." (Gen 28,15). Será que Deus está dizendo a Jacó que o abandonaria depois? E ainda Nosso Senhor depois de haver ressuscitado parece a seus discípulos e diz: "Eis que estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos." (Mt 28,20). Estes exemplos deixam claro que a palavra "até" no texto de Mt 1,25 é um reforço do milagre operado, a saber, a encarnação do Verbo por obra do Espírito Santo, e não por obra de homem [São José]. Outra forma dos protestantes negarem a virgindade perpétua de Nossa Senhora, é alegando que a Bíblia mostra que ela teve outros filhos, além de Jesus. Em diversos lugares, o Evangelho fala desses "irmãos" de Jesus: "estando Jesus a falar, disse-lhe alguém: eis que estão lá fora tua mãe e teus irmãos querem ver-te" (Mt 12, 46-47; Mc 3,31-32; Lc 8,19-20). O argumento protestante somente mostra um ignorância sem tamanho da própria Bíblia que eles dizem conhecer. As línguas hebraica e aramaica não possuem palavras que traduzem o nosso "primo" ou "prima", e serve-se da palavra "irmão" ou "irmã". A palavra hebraica "ha", e a aramaica "aha", são empregadas para designar irmãos e irmã do mesmo pai, e não da mesma mãe (Gn 37, 16; 42,15; 43,5; 12,8-14; 39-15), sobrinhos, primos irmãos (1 Par 23,21), primos segundos (Lv 10,4) e até parentes em geral (Jó 19,13-14; 42,11). Portanto a palavra "irmão" era um expressão genérica. Exitem muitos outros exemplos na Sagrada Escritura. Observamos no Gênesis que "Taré gerou Abraão, Naor e Harã; e Harã gerou a Ló" (Gn 11,27). E Ló então era sobrinho de Abraão. Contudo no mesmo Gênesis, mais adiante Abraão chama a Ló de irmão (Gn 13,8). E mais adiante ainda em Gn 14,12, o Evangelho nos relata a prisão de Ló; e no versículo 14 observamos "Ouvindo, pois Abraão que seu irmão estava preso, armou os seus criados, nascido em sua casa, trezentos e dezoito, e os perseguiu até Dã" Jacó se declara irmão de Labão, quando na verdade era filho de Rebeca, irmã de Labão (Gn 29,12-15). No Novo Testamento, fica claríssimo que os "irmãos de Jesus" não eram filhos de Nossa Senhora. Estes supostos "irmãos" são indicados por São Marcos: "Não é este o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, e de José, e de Judas e de Simão e não estã aqui conosco suas irmãs?" Tiago e Judas, conforme afirma São Lucas eram filhos de Alfeu e Cleófas: "Chamou Tiago, filho de Alfeu... e Judas, irmão de Tiago" (Lc 6,15-16). E ainda: "Chamou Judas, irmão de Tiago" (Lc 6,16). São Mateus diz que José é irmão de Tiago: "Entre os quais estava...Maria, mãe de Tiago e de José" (Mt 27,56). Em São Mateus se lê: "Estavam ali [no calvário], a observar de longe..., Maria Mágdala, Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu". Esta Maria, mãe de Tiago e José, não é a esposa de São José, mas de Cleofas, conforme São João (19,25). Era também irmã de Nossa Senhora, como se lê em São João (19,25): "Estavam junto à cruz de Jesus sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria [esposa] de Cleofas, e Maria de Mágdala". Simão, irmão dos outos três, "Tiago, José e Judas". Portanto estes quatro são verdadeiramente irmãos entre si, filhos do mesmo pai e da mesma mãe. Alfeu ou Cleofas é o pai deles. E ainda se Nossa Senhora tivesse outros filhos ela não teria ficado aos cuidados de São João, que não era da família, mas com seu filho mais velho, segundo ordenava a Lei de Moisés. Agora uma pequena pergunta aos protestantes: Por que nunca os evangelhos chamam os "irmãos de Jesus" de "filhos de Maria" ou "de José", como fazem em relação a Nosso Senhor? E como durante toda a vida da Sagrada Família, os números de seus membros são três? A fuga pra o Egito, a perda e o reencontro no templo, etc. A heresia de negar a virgindade perpétua de Nossa Senhora é mais uma novidade inventada pela Reforma no século XVI. Vejamos agora se os primeiros cristão compartilham dos pensamentos levantados pelos protestantes. São Tiago Menor que realizou o esquema da liturgia da Santa Missa escreveu: "Prestemos homenagem, principalmente, à Nossa Senhora, à Santíssima Imaculada, abençoada acima de todas as criaturas, a gloriosíssima Mãe de Deus, sempre Virgem Maria..." (S. jacob in Liturgia sua). São Marcos na liturgia que deixou às igrejas do Egito serve-se de expressões semelhantes: "Lembremo-nos, sobre tudo, da Santíssima, intermerata e bendita Senhora Nossa, a Mãe de Deus e sempre Virgem Maria". E os testemunhos primitivos acerca da virgindade perpétua de Nossa Santa mãe não páram por ái...

Irmãos e irmãs de Jesus Mt. 13,55 e Mc. 6,3 nomeiam as seguintes pessoas como irmãos de Jesus: Tiago, José (ou Joses - os manuscritos variam na forma), Simão e Judas.Mas Mt. 27,56 diz que junto à cruz estava Maria, a mãe de Tiago e José. Mc. 15,40 diz que ali estava Maria, a mãe de Tiago, o menor, e José. Logo, embora a prova não seja conclusiva, parece que os dois primeiros, Tiago e José (ou Joses), - exceto se supormos que estes eram outras pessoas com os mesmíssimos 67 nomes - eram filhos de outra mãe, e não da Mãe de Jesus. Vemos aqui que o termo "irmão" foi usado para indicar aqueles que não eram filhos de Maria, a Mãe de Jesus. Do mesmo modo, facilmente poderia ter ocorrido o mesmo com os outros dois "irmãos", Simão e Judas. Além disso, se Maria tivesse outros filhos e filhas naturais no tempo da crucificação, seria estranho Jesus ter pedido a João para que cuidasse dela. Especialmente porque Tiago, o "irmão do Senhor" ainda estava vivo em 49 dC (cf. Gál. 1,19); certamente ele poderia ter cuidado dela... Lot, que era sobrinho de Abraão (cf. Gen. 11,27-31), é chamado de "seu irmão" em Gen. 13,8 e 14,14-16. O termo hebraico e aramaico ah era usado para expressar vários tipos de graus de parentesco (v. Michael Sokoloff, "A Dictionary of Jewish Palestinian Aramaic", Bar Ilan University Press, Ramat-Gan, Israel, 1990, p. 45). O hebraico não tem palavra para os parentes. Eles poderiam dizer ben-dod para expressar filho de um tio por parte de pai, mas para outros graus de parentesco eles não precisavam construir uma frase complexa, tal como "filho do irmão de sua mãe" ou "filho da irmã de sua mãe" (para consultar expressões complexas do aramaico, v. Sokoloff, pp. 111 e 139). · Objeção 1: não deveríamos usar o hebraico, já que o grego possui um termo para designar primo e outros tipos de parentes; também os Evangelhos não se utilizam de outras palavras específicas para designar os parentes de Jesus. Ele usam somente o termo grego adelphos, o que significa irmão real. Resposta: A Septuaginta (tradução grega do Antigo Testamento hebraico , cuja abreviatura padrão é LXX), usa o grego adelphos para Lot que, como vimos acima, era, na verdade, sobrinho. Além disso, os escritores dos Evangelhos e Epístolas sempre tinham em mente as palavras hebraicas, mesmo quando escreviam em grego. Isto vale principalmente para São Paulo. E, como podemos ver atualmente, há uma forte evidência de que São Lucas, em certos pontos, estava traduzindo documentos hebraicos - dois tipos de hebraico [hebraico e aramaico] - com grande cuidado. A LXX, para Mal. 1,2-3, traduz: "Eu amei Jacó e odiei Esaú". São Paulo, em Rom. 9,13, cita exatamente da mesma forma que a tradução grega. Ainda que os tradutores da LXX conhecessem o hebraico e o grego - e assim também Paulo - utilizaram um modo muito estranho de expressão, modificando potencialmente a expressão hebraica. Como isso aconteceu? O hebraico e o aramaico carecia dos graus de comparação (tais como: bom, melhor, o melhor; claro, mais claro, claríssimo) e então precisava-se encontrar outra forma de expressar as idéias. Enquanto nós poderíamos dizer: "Amo mais a um que a outro", o hebreu diria: "Amo a um e detesto o outro". Em Lc. 14,26, Nosso Senhor nos diz que devemos "odiar nossos pais"; é óbvio, porém, que quer dizer que devemos amar mais a Cristo do que a nossos pais. De forma semelhante, em 1Cor. 1,17, Paulo afirma: "Cristo não me enviou para batizar, mas para pregar"; só que o próprio Paulo já havia declarado ter batizado algumas pessoas; logo, o que realmente queria dizer é: "Minha missão mais importante é pregar; batizar é menos importante". São Paulo, em 1Tes. 4,5 diz que os gentios "não conhecem a Deus". Ele usa o termo "conhecer" no sentido do hebraico yada, um termo amplo que significa conhecer e amar. De fato, não são raras as vezes em que podemos afirmar que certa palavra hebraica encontrava-se na mente de São Paulo, que se expressava em grego. Todos os estudiosos admitem que o Evangelho de São Lucas possui mais semitismos que os livros escritos por outros semitas (Lucas não era semita, mas médico de origem grega). Por quê? A princípio, parece que Lucas escrevia assim para imitar o estilo da LXX, mas, em um estudo que fiz (v. meu artigo "São Lucas imitava a Septuaginta?", publicado no Jornal [Internacional] de Estudos do Novo Testamento, jul./1982, pp. 30-41, editado pela Universidade de Sheffied, Inglaterra), mostrei, estatisticamente, que Lucas não tentava imitar a Septuaginta. Eu fiz um estudo de um semitismo bem estranho em Lucas: o aditivo kai, que reflete o aditivo hebraico wau. Eis um exemplo tirado de Lc. 5,1: "E isto aconteceu quando as multidões se apertavam para ouvir dele a palavra de Deus e ele se encontrava de pé junto ao Lago [de Genesaré]". A palavra "e", grifada em itálico, poderia existir no hebraico, mas não no grego, nem mesmo no aramaico. Pela contagem real, São Lucas usa este "e" somente de 20 a 25% das vezes que poderia usá-lo se estivesse imitando a Septuaginta. Certamente, não foi esta a razão de seu uso. Então por que ele a empregou assim? Em linhas gerais, São Lucas nos diz que tomou grande cuidado, conversou com testemunhas oculares e checou relatos escritos sobre Jesus. Estes relatos escritos poderiam estar em grego (alguns judeus sabiam se comunicar em grego), hebraico ou aramaico. Logo, seria possível que São Lucas tivesse usado relatos escritos nessas linguagens. O problema não seria perceptível no grego se fossem usadas fontes gregas, é lógico; mas se ele usou, em certos momentos, documentos hebraicos, e se ele os traduziu com extremo cuidado - tão extremo a ponto de manter a estrutura hebraica no texto grego, onde não existiria - então poderíamos afirmar que foi dessa forma que ele resolveu fazer. As estranhas estruturas que encontramos - também anormais no aramaico - usadas por São Lucas em alguns pontos, mas não em outros, parecem demonstrar a existência de documentos hebraicos, traduzidos com extremo cuidado. Lucas sabia como escrever em grego culto, como demonstra certas passagens. Mas por que escreveu assim? Certamente por causa de seu extremo cuidado, para ser fiel aos textos originais que usava. Portanto, precisamos conhecer o hebraico fundamental para compreendermos a questão corretamente (o "e" é omitido nas traduções das linguagens modernas, como o inglês; o problema só é verificável quando lemos São Lucas na língua grega original). Há uma palavra importante em Rom. 5,19, que diz que "muitos" se tornaram pecadores (=pecado original). É óbvio, porém, que São Paulo se referia a "todos". De fato, o grego usa polloi; no grego comum, sempre significa muitos, mas não todos. Entretanto, se conhecermos o hebraico que estava na mente de Paulo, tudo torna-se claro. Havia uma estranha palavra, rabbim, que aparece pela primeira vez em Is. 53, na profecia da Paixão. Pelo contexto, percebemos claramente que significa todos, ainda que também signifique muitos; para ser mais exato, ela significa todos dos que são muitos. Por exemplo, se eu estiver em uma sala com outras três pessoas, eu 68 poderia dizer todos, mas não poderia dizer muitos; agora, se usarmos uma concordância grega para encontrarmos todas as citações em que São Paulo usa a palavra polloi como substantivo, veremos, pelo contexto, que sempre - sem exceção - significará todos; é o caso de Rom. 5,19. Assim, precisamos retornar ao hebraico para compreender o termo grego usado aqui por Paulo. Em outras partes, São Paulo freqüentemente faz uso do termo grego dikaiosyne não na forma estrita utilizada pelo sentido grego, mas na forma ampla do sentido hebraico de sedaqah. Há muitos outros lugares no Novo Testamento onde devemos considerar o fundamento hebraico para obter o sentido correto do grego. Demos apenas alguns exemplos que são suficientes para mostrar como os escritores do Novo Testamento trabalharam e a necessidade de se evitar que entendamos somente o que diz o grego (que insiste que devemos ignorar o fundamento hebraico, afirmando que o grego possui palavras próprias para designar primos e outros parentes, ao contrário do hebraico). · Objeção 2: J. P. Meier, em "A Marginal Jew" (Doubleday, 1991, pp. 325-326) afirma que "o Novo Testamento não é uma tradução grega"; assim, o termo hebraico usado para referir-se a irmão não pode ter gerado uma "desastrosa" tradução. Resposta: muitos estudiosos crêem que parte ou até mesmo todos os Evangelhos são traduções gregas. A evidência citada acima, no "Jornal de Estudos do Novo Testamento" contribui para demonstrar isso. Em adição, temos evidências extensivas mostrando que, apesar dos autores não terem feito uma tradução, eles muitas vezes usavam palavras gregas com o significado do pensamento hebraico fundamental. Isto é especialmente notável em Paulo, ainda que Meier afirme que Paulo não estava fazendo uma tradução, bem como conhecia "Tiago, o irmão do Senhor" em pessoa. Meier também assegura (pp. 327-328) que Josefo, um judeu que escreveu em grego, várias vezes utiliza a palavra correta para designar primo, mas usa a palavra irmão para indicar os "irmãos de Jesus". Concordamos que Josefo assim se expressa. No entanto, será que Josefo possuía informação direta acerca da real natureza dos "irmãos" de Jesus? É óbvio que não. Meier também não analisa a questão sob este ponto de vista... · Objeção 3: Meier afirma (p. 323) que se quisermos que ah signifique primo, então deveríamos ler Mt. 12,50 assim: "Todo aquele que faz o desejo de meu Pai que está nos céus é meu primo, prima e mãe". De maneira similar (p. 357), ele diz que Mc 3,35 deveria então ser lido: "Nem seus primos acreditavam nele". Resposta: Meier parece ser deliberadamente cego nestes pontos. Ora, se ah possui um significado amplo, poderíamos então mantê-lo na tradução, não apenas limitando-o a primo; poderia ser primo, mas também qualquer outra espécie de parente. · Objeção 4: em Mt. 1,25, os protestantes apontam para duas palavras: até que e primogênito. Até que: muitas palavras antigas têm diversos significados possíveis. Às vezes a palavra até que abrange o tempo posterior ao indicado; mas nem sempre isso acontece. Em Dt. 34,6, Moisés foi enterrado "e até hoje ninguém sabe onde se encontra sua sepultura". Isto era verdade no dia em que o autor do Deuteronômio relatou o fato; e continua sendo verdade ainda hoje. No Sal. 110,1, conforme interpretado pelo próprio Jesus, "o Senhor disse ao meu Senhor (=de Davi): ‘Senta à minha mão direita até que eu coloque os teus inimigos sob os teus pés’". Obviamente, Jesus sempre estará à direita do Pai; logo, a palavra até que jamais significará uma mudança de estado. O Sal. 72,7, um salmo messiânico, diz que em seus dias "a paz abundará até a lua não mais existir". Aqui, novamente, o poder do Messiais jamais deixará de existir ainda que a lua deixe de brilhar (Mt. 24,29). Em 2Sam. 6,23, diz-se que "Mical, esposa de Davi, não terá mais filhos até o dia de sua morte". Logicamente, ela não os terá mesmo após sua morte! Em Mt. 11,23, Nosso Senhor diz que se os milagres feitos em Cafarnaum tivessem sido feitos em Sodoma, "ela teria durado até o presente dia". Isso não significa que Jesus a destruiria logo a seguir. Em Mt. 28,20, Jesus promete que permanecerá com sua Igreja e seus seguidores até o fim do mundo. Será que a deserdará depois, na eternidade? Em Rom. 8,22, São Paulo diz que toda a criação suspira, esperando pela revelação dos filhos de Deus até os seus dias (de Paulo). Nem por isso ele irá parar sua missão, mas continuará até a restauração final. Em 1Tim. 4,13, o Apóstolo pede para que Timóteo se devote à leitura, exortação e ensinamento "até eu (Paulo) chegar". Isso não quer dizer que Timóteo deveria parar de fazer tais coisas após a chegada de Paulo. E existe muitos outros exemplos, embora estas poucas citações sejam suficientes para demonstrar que a expressão até que, no Antigo e no Novo Testamento, significa uma mudança de coisas que está para acontecer segundo o ponto a que se refere. Atémesmo J.P. Meier, que trabalha estressantemente para tentar provar que Jesus tinha irmãos naturais, admite que o argumento baseado na expressão até que nada prova (em CBQ - jan./1992, pp. 9-11). Primogênito: Jesus é assim chamado em Lc. 2,7 (e também em Mt 1,25, se considerarmos a adição ao texto grego encontrada na Vulgata latina). Este termo se refere ao hebraico bekor, que expressa principalmente a posição privilegiada do primeiro filho com relação aos demais filhos. Não implica, porém, na existência real de outros irmãos. Podemos ler numa inscrição grega encontrada numa sepultura em Tel el Yaoudieh (cf. Biblica 11, 1930, pp. 369-390) que uma mãe faleceu ao dar à luz ao seu filho: "Nas dores do parto de meu filho primogênito, o destino me trouxe o fim da vida". No mesmo sentido, existe outro epitáfio em Leontópolis (v. "Biblical Archaeology Review," Set.- Out./1992, p. 56). · Objeção 5: Alguns escritores cristãos primitivos dizem que os irmãos do Senhor eram irmãos reais. 69 Resposta: Meier, que tão diligentemente coleta todos os dados que possam servir para contestar a virgindade de Maria após o nascimento de Jesus, menciona apenas quatro: (1) Hegésipo, no séc. II - Mas Meier admite (p. 329): "...tal testemunho não está livre de problemas e possíveis auto-contradições"; (2) Tertuliano - Contudo, Meier reconhece que isto ocorria porque queria "reforçar sua oposição ao ponto de vista docético sobre a humanidade de Cristo"; tal desejo fez com que fizesse tal afirmação. De fato, Tertuliano, com a mesma predisposição, afirmou que a aparência do corpo de Cristo era horrível (Sobre o Corpo de Cristo, cap. 9)! Realmente ele era um extremista, como se comprova pelo fato de que não sendo os montanistas tão severos quanto à moralidade, acabou por fundar sua própria sub-seita; (3) Meier também sugere que duas passagens de Santo Ireneu (séc. II) podem implicar na negação da virgindade pós-parto: na primeira Ireneu faz um paralelo entre Adão e Cristo, para segurança de sua "teologia da recapitulação"; na segunda, Ireneu desenvolve o tema da nova Eva. É difícil, porém, encontrar nessas passagens qualquer dica que negue a virgindade pós-parto. O próprio Meier admite que a interpretação desses textos são improváveis; (4) Helvídio, no séc. IV [totalmente refutado por São Jerônimo]. Estes textos, contudo, são desprezíveis se comparados com o extenso suporte patrístico que favorecem a tese da virgindade perpétua (cf. "Marian Studies," VIII, 1956, pp. 47-93). Por isso, em seu sumário de conclusões (pp. 331-332), Meier não faz qualquer menção a estes escritores da Igreja primitiva. · Objeção 6: Meier (p.331) diz que devemos seguir o critério do múltiplo atestado: Paulo, Marcos, João, Josefo e talvez Lucas atestam a existência dos irmãos de Jesus. Resposta: Isto nada mais é que o retorno ao início da questão. Meier não provou que qualquer um destes "irmãos" seja, de fato, um irmão real de Jesus. Meier acrescenta que o sentido natural de irmão é o que indica irmão real, mas já vimos na segunda resposta (acima), que tal sentido não é absolutamente obrigatório. Ele também afirma que não existe outro caso claro no Novo Testamento que possa admitir outro significado, a não ser irmão real ou meio-irmão. Novamente ele acaba retornando ao início do problema pois não consegue provar que algum desses textos possa significar irmão real. O próprio Meier reconhece (p. 331) que "todos estes argumentos em conjunto não podem produzir uma certeza absoluta". Nós acrescentamos: em Mc. 3,20-21, os parentes de Jesus vão até ele para prendê-lo - os irmãos mais novos não poderiam tomar tal atitude na cultura semita, pois Jesus era o primogênito. E, quando Jesus contava com 12 anos, ao visitar o Templo de Jerusalém, seus irmãos mais novos deveriam acompanhá-lo (exceto as irmãs), se de fato existissem; de outra forma, Maria teria ficado em casa cuidando dos filhos mais novos. Vemos, assim, que não há evidências sólidas na Escritura que nos permitam supor que Nossa Senhora tenha tido outros filhos. Há, por outro lado, respostas lógicas para todas as objeções formuladas. Porém, a razão decisiva é o ensino da Igreja; os credos mais antigos chamam Maria de aei-parthenos, ou seja, "sempre Virgem". Meier parece querer usar um machado para cavar... Em seu longo artigo publicado na CQP (1992, pp. 1-28), ele diz, na última página, que deveríamos perguntar se a hierarquia das verdades não nos deixaria aceitar protestantes dentro da Igreja Católica sem que pedíssemos a eles para que acreditassem na virgindade perpétua de Nossa Senhora. De fato, existe uma hierarquia de verdades, algumas mais básicas que outras. Mas isso não significa, em absoluto, que possamos incentivar a negação de uma doutrina que vem sendo repetidamente ensinada pelo Magistério Ordinário, bem como pelos mais antigos credos (portanto, infalíveis). Realmente, se alguns protestantes querem aderir à Igreja sem aceitar a autoridade do Magistério, então jamais serão católicos de fato, ainda que aceitem todos os demais ensinamentos. Aceitar realmente a autoridade significa aceitar tudo, e não quase tudo. Até mesmo Meier, tão inclinado à negação da virgindade perpétua, admite (pp. 340-341) que existe uma estranha tradição rabínica que diz que Moisés, após seu primeiro contato com Deus, deixou de se relacionar sexualmente com sua esposa. Isto aparece primeiro em Filo de Alexandria e foi suportado, depois, pelos rabinos. Ora, se Moisés, em virtude de um contato externo com Deus, agiu dessa maneira, porque então não poderia ocorrer o mesmo com Nossa Senhora, que foi preenchida pela divina presença para a concepção de Jesus e carregou a própria Divindade em seu ventre durante nove meses? De fato, Lutero e Calvino, como Meier reconhece (p. 319), aceitaram a doutrina da virgindade perpétua de Maria. Por que, então, Meier luta tanto contra ela? Realmente, os protestantes, se forem lógicos, não podem apelar para provas bíblicas, a partir do momento em que nem mesmo têm como determinar quais livros são inspirados. Lutero achava que se um livro pregasse a justificação somente pela fé, então ele era inspirado; caso contrário, não. Mas, lamentavelmente, ele nunca conseguiu provar que isso era verdade (tanto ele quanto eu poderíamos escrever livros sobre o assunto e nem por isso seriam inspirados); eis que vários livros da Bíblia não mencionam a justificação pela fé... É que, infelizmente, Lutero não sabia o que São Paulo queria dizer com a palavra fé... (sobre este assunto, consultar a obra fundamental do Protestantismo, "Interpreter's Dictionary of the Bible", Supplemento, p. 333).


ARQUIDIOCESE DE BRASÍLIA
PARÓQUIA SÃO JOSÉ
CATEQUESE DE CRISMA


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