O demônio tem medo da Mãe de Deus
Não só do céu e dos santos é Maria Santíssima Rainha, senão também do inferno e dos demônios, porque os venceu valorosamente com suas virtudes. Já desde o princípio do mundo tinha Deus predito à serpente infernal a vitória e o império que sobre ela obteria nossa Rainha. “Eu porei inimizade entre ti e a mulher; ela te esmagará a cabeça! (Gn 3, 16). Mas que foi esta mulher, sua inimiga, senão Maria, que com a sua profunda humildade e santa virtude sempre venceu e abateu as forças de Satanás, como atesta S. Cipriano? É para se notar que Deus falou “eu porei” e não “eu ponho” inimizade entre ti e a mulher. Isto faz para mostrar que a sua vencedora não era Eva, que já então vivia, mas uma sua descendente. Esta devia trazer a nossos primeiros pais, como diz S. Vicente Ferrer, um bem maior do que aquele que tinha perdido com o seu pecado. Maria é, portanto, essa excelsa mulher forte que venceu o demônio e, em lhe abatendo a soberba, lhe esmagou a cabeça, conforme as palavras do Senhor: Ela te esmagará a cabeça. Duvidam alguns se estas palavras se referem a Maria ou a Jesus Cristo, porque os Setenta¹ traduzem autós, isto é, ele esmagará a tua cabeça. Mas em nossa Vulgata (única versão da Sagrada Escritura aprovada pelo Concílio de Trento) lê-se ipsa, ela e não ipse, ele. Assim também o entenderam S. Ambrósio, S. Jerônimo, S. Agostinho e muitíssimos outros. Mas, como quiserem, é certo que, ou o Filho por meio da Mãe, ou a Mãe por virtude do Filho, venceu a Lúcifer. Este espírito soberbo foi, portanto, para sua vergonha, calcado aos pés por esta Virgem bendita, na frase de S. Bernardo, e como prisioneiro de guerra é obrigado a obedecer sempre às ordens desta Rainha. Diz S. Bruno de Segni que Eva, vencida pela serpente, nos trouxe a morte e as trevas. Maria, porém, vencendo o demônio, nos trouxe a vida e a luz. E de tal modo o atou, que ele não pode mais se mover para causar o menor dano aos seus devotos.
É bela a explicação que dá Ricardo de S. Lourenço ao trecho dos Provérbios: “O coração do homem (isto é, de Cristo) põe nela a sua confiança e ele não necessitará de despojos” (31, 11), pois Maria enriqueceu seu Filho com os despojos que arranca ao demônio. Deus confiou a Maria o Coração de Jesus para que ela o faça amar pelos homens, comenta Cornélio a Lápide, e assim não lhe faltarão despojos, isto é, almas conquistadas. Porque Maria o enriquece de almas, das quais despoja o inferno, livrando-as do demônio com o seu poderoso socorro.
É a palma um conhecido símbolo de vitória. Por isso foi nossa Rainha colocada num alto trono, à vista de todos os potentados celestes, como palma em sinal de segura vitória, que a si mesmos podem prometer-se todos aqueles que se põem debaixo do seu patrocínio. “Eu lancei em alto os meus ramos como a palmeira em Cades” (Eclo 24, 18), isto é, acrescenta S. Alberto Magno, eu estendo minha mão sobre vós para vos proteger. Filhos, parece Maria nos dizer, quando o demônio vos assaltar, recorrei a mim, olhai para mim e tende ânimo, porque em mim, que vos defendo, vereis juntamente a vossa vitória. Por isso o recorrer a Maria é um meio seguríssimo para vencer todos os assaltos do inferno. Ela é também Rainha do inferno e senhora dos demônios, pois que os subjuga e doma, diz S. Bernardino de Sena. Daí vem ser Maria chamada “terrível como um exército em ordem de batalha” (Ct 6, 3). Pois sabe ordenar bem o seu poder, a sua misericórdia e os seus rogos para a confusão dos inimigos e benefícios dos seus servos, que nas tentações invocam o seu poderosíssimo nome.
“Semelhante à vinha dei frutos de suave odor” – fá-la dizer o Espírito Santo (Eclo 24, 23). Aqui observa S. Bernardo: Dizem que toda serpente venenosa foge das vinhas em flor; assim fogem os demônios das almas afortunadas em que sentem o perfume da devoção de Maria. Ela é comparada também ao cedro: Crescendo, me elevei como o cedro no Líbano (Eclo 24, 17). À semelhança do cedro que é incorruptível, ficou também Maria isenta do pecado. E como o cedro afugenta com seu odor as serpentes, observa o Cardeal Hugo, com sua santidade Maria afugenta os demônios. Por meio da arca os israelitas obtinham suas vitórias nos combates. Graças a ela triunfaram de seus inimigos, sob Moisés. E quando se elevava a arca, dizia ele: Levanta-te, Senhor, e dissipem-se os teus inimigos! (Nm 10, 35). Assim foi tomada Jericó, assim foram desbaratados os filisteus, porque a arca de Deus estava naquele dia com os filhos de Israel (1Rs 14, 18). Ora, como se sabe, era a arca figura de Maria. Assim como na arca estava o maná, observa Cornélio a Lápide, no seio de Maria estava Jesus, de quem o maná foi figura. Por meio desta arca concede-nos ele a vitória sobre o mundo e o inferno. Isto motiva as palavras de S. Bernardino de Sena: Quando Maria, arca do Novo Testamento, foi exaltada nos céus como Rainha, ficou abatido o poder do demônio sobre o homem.
Oh! Quanto tremem de Maria e do seu grande nome os demônios do inferno! Observa Conrado de Saxônia. Ele os compara àquele inimigo de que fala Job: Arromba nas trevas as casas... ; se de súbito aparece a aurora, crê que é a sombra da morte (24, 16, 17). Aproveitando as trevas, vão os ladrões roubar nas casas, mas, quando surge a aurora, fogem como se lhes aparecesse a imagem da morte. Assim também, continua Conrado, penetram os demônios na alma, quando a obscurece a ignorância. Mas, no momento em que surge a aurora, isto é, a graça e a misericórdia de Maria, dissipam-se as trevas e dela fogem os inimigos infernais, como diante da morte. Bem-aventurado, pois, aquele que nos assaltos do inferno invoca sempre o belo nome de Maria!
Para confirmar o que dizemos, sirva uma revelação feita a S. Brígida. Deus concedeu a Maria um poder muito grande sobre todos os demônios. Sempre que eles atacam algum devoto da Virgem, e este a invoca em seu auxílio, basta um aceno de Maria para que fujam aterrorizados. Preferem até ver redobrados os seus suplícios a sentirem-se dominados pelo poder de Maria.
O celeste Esposo louvou esta sua Esposa e chamou-lhe lírio, dizendo: Como o lírio entre os espinhos, assim é minha amiga entre as virgens (Ct 2, 2). Como o lírio é um antídoto contra as serpentes e os venenos, reflete Cornélio a Lápide, assim é a invocação do nome de Maria singular remédio para vencer todas as tentações, especialmente contra a pureza, como o ensina a experiência. Cosmas de Jerusalém assim se dirige a Maria: Ó Mãe de Deus, se confiar em vós, não sereis certamente vencido; pois, defendido por vós, perseguirei meus inimigos; triunfarei com certeza, opondo-lhes como escudo a vossa proteção e o vosso onipotente patrocínio. Entre os Padres Gregos escreve Jacob, monge: Senhor, vós nos destes nesta Mãe poderosíssima arma com a qual vencemos seguramente todos os nossos inimigos.
Lemos no Antigo Testamento que o Senhor guiava o seu povo na saída do Egito, de dia por meio de uma coluna de nuvem, e à noite por uma coluna de fogo (Êx 13, 21). Esta maravilhosa coluna, ora de nuvem ora de fogo, era, no dizer de Ricardo de S. Lourenço, figura de Maria e dos dois ofícios que exerce continuamente para nosso bem.
Como nuvem protege-nos dos ardores da divina justiça; como fogo defende-nos contra os demônios. Assim como a cera se derrete ao calor do fogo, acrescenta Conrado de Saxônia, também perdem os demônios toda a força sobre as almas que, lembradas do nome de Maria, a invocam com freqüência e principalmente procuram imitá-la.
ORAÇÃO
Aqui está aos vossos pés, ó Mãe de meu Deus e minha única esperança, um miserável pecador que tantas vezes por suas culpas se tem tornado escravo do inferno. Reconheço que de mim triunfou o demônio, porque não recorri, ó meu refúgio, ao vosso auxílio. Se eu vos tivesse chamado sempre em meu socorro, se vos houvesse invocado, jamais teria perecido. Eu espero, amabilíssima Senhora, por vossa intercessão ter já saído das mãos do demônio e ter obtido de Deus o perdão. Receio, entretanto, vir para o futuro a cair novamente em pecado. Sei que meus inimigos não perderam a esperança de tornar-me a vencer e me estão preparando novos assaltos e tentações. Ah! Minha Rainha e meu refúgio, ajudai-me; tomai-me sob o vosso manto e nunca permitais que eu torne a ser presa do inferno. Sei que sempre me haveis de valer e dar vitórias todas as vezes que vos invocar. Temo, contudo, que nas tentações me esqueça de chamar-vos em meu socorro. Eis, portanto, a graça que vos imploro e de vós espero, ó Virgem Santíssima. Fazei que sempre vos tenha presente à memória, especialmente nas lutas contra as tentações. Ajudai-me para que então vos diga muitas vezes: Maria, valei-me, valei-me, ó Maria. E quando chegar finalmente o dia de minha última luta com o inferno, na hora da morte, assisti-me então, ó minha Rainha, de modo especial. Fazei vós mesma que eu me lembre de invocar-vos sem cessar, com a boca ou com o coração, para que, expirando com vosso dulcíssimo nome e de vosso Filho Jesus nos lábios, possa ir vos bendizer e louvar, e nunca mais separar-me de vossos pés, por toda a eternidade no paraíso. Amém.
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1) É o nome dado aos 70 judeus que traduziram a Sagrada Escritura, do hebraico para o grego.
Trecho da meditação é retirado do livro “Glórias de Maria”, de Santo Afonso de Ligório.
Parte I, explicação da Salve Rainha – As abundantes e numerosas graças dispensadas pela Mãe de Deus aos que a servem devotamente.
Cap. IV A vós bradamos, os degredados filhos de Eva.
II- O poder de Maria para defender os que a invocam nas tentações do demônio
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