Por Maria Clara Bingemer
Maria de Nazaré, mãe de Jesus. Quem é essa que a Igreja proclama e venera como bendita entre todas as mulheres e cheia de graça? O que ela nos diz sobre o mistério de Deus, da vida, do ser humano homem e mulher?
Maria de Nazaré, mãe de Jesus. Quem é essa que a Igreja proclama e venera como bendita entre todas as mulheres e cheia de graça? O que ela nos diz sobre o mistério de Deus, da vida, do ser humano homem e mulher?
A teologia hoje trata de fazer uma releitura da Maria de acordo com as exigências de nosso tempo. Essa releitura dá testemunho, sobretudo, do momento privilegiado que vive a humanidade inteira com o despertar da consciência histórica da mulher.
Com relação à interpretação sobre o mistério de Maria de Nazaré, portanto, há que ressaltar três pontos:
a) O povo tem imenso carinho por Maria, a mãe de Jesus. E este amor expressa o clamor em busca de socorro, qualquer que este seja. Isto parece transparecer a espiritualidade mariana do povo mais simples. Maria é a esperança, a mãe, a protetora, aquela que não abandona seus filhos.
b) Existe hoje, igualmente, uma maneira diferente e própria de ler os textos bíblicos. Os textos que falam d Maria são muito poucos na tradição neotestamentaria. Porém, cada época histórica parece construir, a partir deles, uma imagem de Maria e de sua atuação histórica passada e presente.
c) O conceito de Reino de Deus é essencial para essa hermenêutica. Vai além da pessoa de Jesus e afeta a totalidade de seu movimento, do qual participavam homens e mulheres de forma ativa. Entre eles está incluída María, essa judia que é mãe de Jesus, com sua paixão pelos pobres e pela justiça de Deus, com sua memória perigosa e subversiva.
Nesta perspectiva hermenêutica, Maria não é somente a encantada e suave mãe de Jesus, mas também e, sobretudo, trabalhadora na colheita do Reino, membro ativo do movimento dos pobres criado por seu filho Jesus de Nazaré.
Mesmo os dogmas marianos devem ser pensados à luz dos pressupostos hermenêuticos anteriormente descritos e refletidos em chave eclesiástica e pastoral. E o que nos dizem estes dogmas?
1. Maria é mãe de Deus, figura e símbolo do povo que crê e experimenta essa chegada de Deus que agora pertence à raça humana Esta mesma que chamamos Mãe e Nossa Senhora é, porém a pobre e obscura mulher de Nazaré, mãe do carpinteiro subversivo e condenado à morte. Depois do título de glória e as luxuosas imagens com que a piedade tradicional a representa, Maria ensina a maternidade como serviço, inspiração para a Igreja que deseja ser servidora dos pobres, para quem a encarnação de Jesus em Maria traz a boa nova da liberação.
2. Maria é virgem, não de um ponto de vista moralizante e idealizado. Trata-se, ao invés, da glória de Deus onipotente que se manifesta naquilo que é pobre, impotente e desprezado aos olhos do mundo. A preferência de Deus pelos pobres se torna clara e explícita ao encarnar-se ele mesmo no seio de uma virgem, inserindo-se na linha de serviço dos pobres de Yahvé.
3. Maria é Imaculada e isso é garantia de que a utopia de Jesus é realizável nesta pobre terra. A Imaculada Concepção venerada nos altares é a pobre Maria de Nazaré, que leva sobre si a confirmação das preferências de Deus pelos mais humildes, pequenos e oprimidos. O assim chamado «privilégio Mariano» é, na verdade, o privilégio dos pobres.
4. Maria é Assunta aos céus e assim a humanidade e, muito especialmente, a mulher, têm a dignidade de sua condição reconhecida e assegurada pelo criador. A mulher que deu à luz em um estábulo, entre animais, que teve o coração transpassado por uma espada de dor, que compartilhou a pobreza, a humilhação, a perseguição e a morte violenta de seu Filho, que esteve a seu lado ao pé da cruz, a mãe do condenado, foi exaltada. É a culminação gloriosa do mistério das preferências de Deus por aquilo que é pobre, pequeno e desamparado neste mundo para fazer brilhar ali sua presença e sua glória.
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